PMA em Portugal
A avaliação e o tratamento de situações clínicas de infertilidade conjugal fazem parte das preocupações médicas há mais de um século. As alternativas terapêuticas foram evoluindo em paralelo com os desenvolvimentos de outras áreas da medicina. Nos anos 60 e 70 do século passado, foram efetuadas, sobretudo por autores ingleses, investigações profundas sobre os fenómenos ligados à reprodução, que culminaram na introdução de uma nova técnica terapêutica com componente laboratorial complexo – a Fertilização in Vitro (FIV). O nascimento da primeira criança resultante desta técnica teve lugar a 25 de julho de 1978.
Ao mesmo tempo que decorriam acesas discussões sobre implicações de índole diversa (ética, filosófica, religiosa) a técnica foi sendo estabelecida rapidamente noutros países numa demonstração não só da sua necessidade clínica mas também do elevado sentido de partilha científica e de abertura de espírito dos especialistas detentores do conhecimento inicial.
Em Portugal, o primeiro ciclo terapêutico de FIV foi efetuado no Hospital de Santa Maria/ Faculdade de Medicina de Lisboa (equipa dirigida pelo Prof. Doutor Pereira Coelho) em julho de 1985. A primeira criança portuguesa cuja fecundação ocorreu por FIV nasceu em fevereiro de 1986. No entanto, o recurso a procedimentos laboratoriais para o tratamento de casais inférteis iniciara-se no nosso país alguns meses antes da FIV, em maio de 1985, com a execução da inseminação artificial intrauterina - a menos complexa dessas técnicas - na Faculdade de Medicina do Porto (Prof. Doutor Alberto Barros). Seguiu-se a introdução de variantes, como a Transferência Intratubária de Gâmetas (GIFT na sigla inglesa) em 1986 – Hospitais da Universidade de Coimbra/ Faculdade de Medicina de Coimbra (equipa dirigida pelo Prof. Doutor Agostinho Almeida Santos) entre outras, ou de técnicas sucedâneas como a criopreservação de embriões (Maternidade Dr. Alfredo da Costa, em 1990 – equipa dirigida pelo Dr. Elmano Barroco) e a Microinjeção Intracitoplasmática de Espermatozoides, designada pela sigla inglesa ICSI (equipa dirigida pelo Prof. Doutor Alberto Barros, 1994).
No seu conjunto, as técnicas de tratamento de situações de infertilidade conjugal com apoio laboratorial passaram a ser designadas por Procriação (ou Reprodução) Medicamente Assistida – PMA. Ao longo dos anos, importantes evoluções nos conceitos e nos aspetos técnicos levaram a que algumas variantes (a GIFT, atrás referida, e diversas outras não mencionadas) fossem praticamente abandonadas em todo o mundo. Em contrapartida, sofreram estabilização outras técnicas como o Diagnóstico Genético Pré-Implantação, atualmente designado de Testes Genéticos Pré-implantação (efetuado pela primeira vez em Portugal na Faculdade de Medicina do Porto pelo grupo dirigido pelo Prof. Doutor Alberto Barros, em 1998).
A utilização clínica destas metodologias sofreu grande expansão em todo o mundo, estimando-se que já tenham nascido mais de 3 milhões de crianças como resultado do seu uso. Há mesmo países europeus em que 5% ou mais das crianças nascidas resultam de PMA. Este valor torna bem evidente que, para lá do que representa para um casal ou individualmente ao contribuir para alcançar projetos de parentalidade, este conjunto de técnicas tem uma enorme relevância social.
Como é possível objetivar com a análise dos resultados europeus publicados anualmente, Portugal encontra-se num patamar técnico-científico semelhante ao dos países mais desenvolvidos. Tal deveu-se não só ao empenhamento e qualidade dos pioneiros da PMA mas também ao bom desempenho de grupos de profissionais de várias áreas clínicas e não clínicas.
Em termos quantitativos, tem havido no nosso país algum incremento da atividade nesta área mas ainda insuficiente para responder quer aos problemas dos casais com indicação para estas técnicas no âmbito da resolução do seu problema de infertilidade, quer aos demais beneficiários que pretendam recorrer a técnicas de PMA para conseguirem a gravidez que procuram.
De acordo com os últimos dados disponíveis, em 2016 o número de crianças originadas em tratamentos com PMA representou cerca de 3% do total de crianças nascidas em Portugal.
As implicações complexas da aplicação destas metodologias, não só clínicas e científicas mas sobretudo éticas e jurídicas, justificam a enorme diversidade de enquadramentos legais nos vários países, inclusive da Europa. Em Portugal, a PMA foi regulada em 2006 pela Lei n.º 32/2006, de 26 de julho que criou o Conselho Nacional de Procriação Medicamente Assistida como entidade reguladora da prática desta atividade. Em junho de 2016 foi aprovado o alargamento dos beneficiários, garantindo o acesso de todas as mulheres a técnicas de PMA.